segunda-feira, 30 de setembro de 2013

quem q'eu me lembro

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que abriu seu próprio corpo, em autópsia, para procurar qualquer coisa que havia perdido.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

retificações


Eu disse não, ela insistiu. Depois de 3 horas descobri que estava errado.
 Não volto atrás.

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sábado, 8 de junho de 2013

Cortei o pedaço das águas sobre a folha e construí o orvalho onde repousaríamos. Você colocou a cabeça em meus ombros e com uma voz triste trouxe uma história que anexei em meu larousse para traduzir qualquer sentimento que ainda não houvesse nomes. Deste dia ainda tenho a foto do céu, e nela consigo ver o final do universo, ainda desfocado. Encontrei-a outro dia, dentro do livro que havia levado na ocasião caso ficássemos em silêncio e isso nos constrangesse. Desde a descoberta, comecei a entender o sentido de tua história, ou de qualquer história, antes do sentido. Nelas apenas há vida.

Quando o vento bate sobre os coqueiros ao lado de minha casa penso que é chuva. O barulho, aos meus ouvidos, é o mesmo. As folhas dançam umas com as outras como os pingos de água batem no chão. Recordo-me disto para lembrar que também sou passível aos erros. Agora eu me lembro, naquele dia, tua voz era apenas tristeza ou havia dengo? Existe em toda tristeza uma parte de carência? 

domingo, 7 de abril de 2013

fim de tarde


Chegaram em casa exaustos. Ela veio o caminho todo rindo, feliz, como sempre se manteve. Ele abriu a porta e a deixou tirar a água do mar primeiro, enquanto ele cozinhava uma sopa para o jantar. Os pés molhados só traziam para a sala um pouco da praia e da denúncia daquela tarde. Estiveram lá e tudo foi real.

Teresa saiu do banheiro com um roupão rosa enquanto secava seu cabelo com uma toalha branca. Só agora Jonas havia reparado que o sol veio se prolongar na pele dela, e aquela cor ressaltava o verde dos olhos daquela mulher que um dia ele amou. Essa era a diferença entre eles; Teresa carregava a natureza, Jonas não tinha espaço nem para o humano.

- Fiz sopa, gosta? Posso servir.

- Sim, quero provar como você se sai na cozinha. Lembra na faculdade que você sempre deixava o arroz queimar? Teresa riu, mas não pra ferir. Falar do passado não é ofensa, é saudade. Manteve o riso no rosto e os olhos no prato vazio.

- Sabe, Jonas? Estou começando a pintar. Vejo a cada dia que a pintura é superior a literatura, sabe? Sei que vai me achar ingênua, e que no futuro eu possa mudar de ideia… Também é isso, não tenho mais medo do temporário. As palavras parecem que já não são minhas, sabe? Lemos demais quando mais jovens... E cada cor, para mim, parece uma descoberta… As formas são verdadeiramente minhas.

Jonas manteve-se calado, serviu a sopa em dois pratos e sentou-se. Recriminou-a, pedante. Diminuir a literatura era a pior das ofensas. Já não tinha mais o seu meio.

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my baby shot me down


Só quando ela sentiu entre nossas cinturas que eu estava armado, percebeu que corria perigo. Confesso, quando também percebi que ela estava em defesa, não tardei muito para ir ao ataque. O primeiro tiro errôneo passou de raspão. Ela me chamou, no fim da canção, ao fundo do bar – que pela vista magnifica deveria ser todo o começo, as entradas deveriam ser mais belas. Então me disse que já eramos muito grande para brincar de faroeste  e que também eu nunca tive muito jeito pra cowboy, não discordei. Baixei minha cabeça e ela voltou pra pista, enquanto meu corpo com muito esforço tentava se esquentar para também voltar à dança. O baile chegaria ao final bem antes do sol nascer, só quando já escrevia a história o galo pôs-se a cantar.

Ela me beijou dizendo que estávamos quites, e que seu tiro foi mais certeiro. 

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

vaga onda

Yemanjá, via google imagens. 




















Lembrei-me de jéssica e seus longos olhos – que só mais tarde eu descobri que machado já descrevera, a me fitar pelo longo balé público duma festa popular. Se me pedissem um retrato dela, agora, apenas tocaria uma música espanhola sobre um longo fundo branco que se cria o feito do sem-fim (ou infinito, que é antes mais poético, mas não deixa de ser matemático). A vaga lembrança que tenho de jéssica é deste momento, que carrega outros e outros em seu cabelo de índia que flutuava em uma gravidade diferente de seu corpo. Foi, como lembrei, assim; eu deveria ter doze anos, próximo a formar treze, ela também, em uma férias de verão na ilha. Era uma festa, e no palco tocava uma velha canção de axé quando cheguei ao salão (só me lembrei desta história, ou primeiramente da canção, ou, se possível, tudo em um único momento de descoberta, quando, neste ano, aproximadamente dez anos depois do dia, estava no mesmo local e a mesma canção soava – agora com a pura nostalgia de quem já viveu algum amor). Jéssica estava ali, de blusa branca e a mesma pele negra, um pouco mais a frente. Não foi díficil avista-la no meio das centenas de pessoas que também estavam ali presentes, mesmo sendo crianças, conseguimos identificar a amada em quilômetros – e o amor de olhos vendados. Ela também sentiu. No ritmo da música olhou para trás, e seus longos cabelos, como cortinas de teatro que se abre para o espetáculo e logo se fecha para as palmas, deixou espaço para seus olhos colarem diretos em mim. Fechei os olhos, abri, dez anos depois, jéssica não estava lá. Nem a sua face. Tenho tentado lembrar de jéssica, de seu rosto, mas não lembro; lembro da blusa branca de uma só alça, de sua perna longa e no final um short jeans, de seu corpo na tarde dentro do mar, de sua perna curvando no parque, de sua risada no cais... De seus longos olhos. Mas quando tento lembrar de sua face, me vem a face de géssica roqueira, e as confussões d’Eu menino com tantos nomes iguais, me vem a face da menina nervosa de sardas que me força a lembrar seu nome, me vem o rosto tímido de fernanda, das duas faces das gêmeas, todas em um mesmo rosto - sobrepostas, me vem o rosto da outra géssica e o seu sinal que, em minha memória, toda hora muda de local, com seu sorriso cínico de já-mulher... Por horas tento reconstruir a imagem de jéssica-índia, mas a vejo entrar no mar com sua face coberta por pérolas que refletem no espelho, ela se vira, e de costas, vejo-a deitar sobre o mar entre o reflexo da lua. Jéssica é a minha boa memória de que o mar é feminino, la mer.